O desenvolvimento da civilização
A nossa espécie, Homo
sapiens, existe há apenas 100 mil anos, tendo em vista que o gênero ao qual
pertencemos, o gênero Homo, surgiu há
muito mais tempo, a cerca de 2 milhões de anos. Os nossos ancestrais primitivos
viviam em cavernas e saíam para coletar alimentos, sempre guiado pelos seus
instintos. O processo civilizatório teve início há uns 10 mil anos, quando a
espécie humana abandonou o estio de vida nômade e passou a fixar-se na terra,
dando início à sua transformação de caçador e coletor em agricultor e criador
de animais. Esse processo não se deu instantaneamente, muitos fatores
contribuíram para essa evolução intelectual do ser humano. Na perspectiva do
processo civilizatório podemos destacar a descoberta do fogo, desenvolvimento
das primeiras atividades agrárias, domesticação de animais; as religiões, a
invenção da imprensa de tipos móveis; descoberta da eletricidade, a Revolução Industrial,
os métodos anticoncepcionais; os avanços da informática, tecnologia e educação.
Para estudar como os grupos primitivos cuidavam de doentes,
seria preciso antes de tudo examinar os achados arqueológicos, pois a
arqueologia é a ciência que traz à luz as marcas da existência do homem no
passado remoto para ser escrutinadas. A história tem sido registrada através
dos tempos em pedras, objetos, instrumentos, inscrições hieroglíficas ou
cuneiformes, papiros e finalmente livros e documentos.
O ritual do cuidar
Seja qual for o ângulo de análise, a retomada do passado vem
demonstrar que as práticas de saúde – tão antigas quanto a humanidade, porque
inerentes à sua própria condição de sobrevivência – desenvolveram-se entre as
primeiras civilizações do Oriente e do Ocidente, destacando-se, tanto nos
velhos países do continente europeu, quanto nas culturas orientais. Foram
influenciadas pelas doutrinas e dogmas das mais diversas correntes religiosas.
Do paganismo ao budismo, passando pelo judaísmo e pelo islamismo, até o
cristianismo, todas marcaram sua trajetória de maneira contundente, como se
pode observar a seguir:
▪ Assíria e Babilônia: A medicina baseava-se em
crendices e magias, os sacerdotes comercializavam talismãs com orações contra
os ataques demoníacos, que, segundo a crença, eram os causadores das doenças.
As curas aconteciam como milagres de Deus. Seus documentos não fazem menção nem
a hospitais nem a enfermagem. O maior
rei babilônio, Hamurabi (1792 a.C. – 1750 a.C.), elaborou um sistema de leis
muito avançado para a época, compilando leis sumerianas severas como a do “olho
por olho, dente por dente”, que ficou conhecido como o Código de Hamurabi, que
não foi superado durante toda a Antiguidade e exerceu influência na legislação
de hebreus, gregos e romanos. O Código de Hamurabi já previa normas de condutas
para o sacerdote/médico, uma das quais estabelecia que, se ele errasse no
tratamento de um homem livre, teria sua mão arrancada. Previa também que o
valor cobrado pelo serviço prestado a um homem livre não deveria ser o mesmo
que o praticado a um escravo. A Babilônia foi destruída pelos assírios, mas
reconstruída por Nabucodonosor (605 a.C. – 562 a.C.).
▪ O Velho Testamento e o Código Mosaico: As mais
antigas tradições do povo hebreu são encontradas no Gênesis, o primeiro livro
do Velho Testamento, em que surge a figura de Abraão, seu patriarca. Segundo a
crença, Abraão foi chamado por Deus para abandonar o ambiente politeísta
babilônio, então ele partiu com sua esposa, Sara, para Canaã; os hebreus
passaram a ser os escolhidos por Deus, que os guiou e fez revelações como Os 10
mandamentos, por meio de Moisés, descendente de Abraão. Esses mandamentos,
cujos preceitos são válidos até hoje, incorporam importantes regras éticas de
relacionamento humano e oferecem até mesmo um quadro de referência para a saúde
mental. Moisés estabeleceu também um código – o Código Mosaico – para regular
as práticas religiosas que abrangia aspectos sanitários, morais e de saúde. O
Código Mosaico apresentava de forma sistemática e organizada os métodos para
prevenir doenças, por meio de certas regras de higiene pessoal, alimentação,
repouso etc. Previa também normas gerais para inspeção e seleção de animais
para o abate, cuidado com excreta e notificação em caso de doença contagiosa,
para assegurar isolamento, quarentena e desinfecção. Portadores de lepra deveriam
ser isolados da coletividade, e os meninos deveriam ser circuncidados no oitavo
dia de nascimento.
▪ China: Por intermédio do islamismo, a influência
árabe alcançou a Índia, a China e outras culturas. Eles traduziram e difundiram
os escritos de Hipócrates e de Galeno. Na China, os doentes eram cuidados com
plantas medicinais nos tempos por sacerdotes, eles dividiam as doenças em
benignas, médias e malignas e ocupavam-se da cura de acordo com sua
classificação. Construíram hospitais e casas de repouso, conheciam a arte da
cirurgia e tratavam a varíola e a sífilis, anestesiavam com ópio e utilizavam
arsênico em doenças de pele, além da acupuntura e da cauterização. Deixaram
como legado o princípio da medicina chinesa, que considera o Yin-feminino e do
Yang-masculino como representante do equilíbrio interior e do estado de
harmonia do ser humano para com o universo. Enfatizavam a prevenção das doenças
pela manutenção desse equilíbrio. Para eles, as doenças eram resultantes também
das forças anímicas e dos maus espíritos. Foram os únicos a descrever os passos
de ouvir, ver, sentir, observar, indagar, como ações a serem realizadas antes
de um diagnóstico.
▪ Egito: Para os egípcios, detentores de vastos
saberes e práticas da medicina de sua época, as receitas deveriam ser tomadas
junto com recitações de fórmulas mágico-religiosas. A hospitalidade e o auxílio
aos necessitados faziam parte de suas práticas, que eram realizadas em
ambulatórios gratuitos. Utilizavam a interpretação de sonhos e o hipnotismo na
cura de doenças.
▪ Índia: São inúmeras as menções históricas que
enfatizam o conhecimento de anatomia e a arte humanística dos hindus no ramo da
saúde, destacando-os como verdadeiros mestres da cura. O budismo contribuiu
sobretudo para o desenvolvimento da enfermagem e da medicina, tanto que eles
são os únicos que citam enfermeiros, exigindo destes conhecimentos científicos,
habilidades e elevados princípios morais. Construíram vários hospitais, onde
utilizavam e valorizavam a musicoterapia e os narradores de história, como
forma de distração para os enfermos. Realizavam diversos procedimentos, como
trepanações, suturas, amputações e correções de fraturas, deixando diversos
testemunhos desses feitos em sua cultura.
▪ Japão: A medicina japonesa tornou-se muito
conhecida pelo uso intensivo da hidroterapia na cura de doenças. Sua cultura
favorecia e estimulava a prática da eutanásia.
▪ Grécia: A mitologia grega, seus deuses e heróis
são o motor da história da medicina ocidental, através dos seus sacerdotes e
cirurgiões-barbeiros. Hipócrates, o pai da medicina, dissociou a crendice das
práticas de saúde, dando uma nova versão mais científica à história da
medicina. Os tratamentos utilizados eram os recursos da natureza, como banho de
sol, ar puro, água pura, sangrias, massagens e dietas, nos templos.
▪ Roma: Com uma prática medica menos prestigiada que
a grega, porém destacados quanto à higiene e a à saúde pública, por meio de
seus aquedutos, esgotos, cisternas e banhos públicos; a medicina romana aliava
o religioso o mágico e o popular e, durante muito tempo, foi exercida por
estrangeiros e escravos.
Desenvolvimento
histórico das práticas de saúde
A periodização obedece à relação do objeto de pesquisa com a
realidade histórica e é identificada por pontos críticos, em que ocorre
transformação qualitativa ou mudança nessa relação, ficando assim subdivida:
▪ As práticas de saúde instintivas: Caracteriza a
prática do cuidar nos grupos nômades primitivos, tendo como pano de fundo as
concepções evolucionista e teológica.
▪ As práticas de saúde mágico-sacerdotais: Aborda a
relação mística entre as práticas religiosas e as práticas de saúde primitivas
desenvolvidas pelos sacerdotes nos tempos. Este período corresponde à fase de
empirismo, verificada antes do surgimento da especulação filosófica que ocorre
por volta do século V a.C.
▪ As práticas de saúde no alvorecer da ciência:
Relaciona a evolução das práticas de saúde ao surgimento da filosofia e ao
progresso da ciência, quando estas, então, baseavam-se nas relações de causa e
efeito. Inicia-se no século V a.C., estendendo-se até os primeiros séculos da
Era Cristã.
▪ As práticas de saúde monástico-medievais: Focaliza
a influência dos fatores socioeconômicos e políticos do medievo e da sociedade
feudal, nas práticas de saúde e as relações destas com o cristianismo. Esta
época corresponde ao aparecimento da Enfermagem como prática leiga desenvolvida
por religiosos, abrangendo o período medieval compreendido entre os séculos V
XIII.
▪ As práticas de saúde pós-monástica: Evidencia a
evolução das práticas de saúde e, em especial, da prática de Enfermagem no
contexto dos movimentos renascentistas e da Reforma Protestante. Corresponde ao
período que vai do final do século XIII ao início do século XVI.
▪ As práticas de saúde no mundo moderno: Analisa as
práticas de saúde e, em especial, a de Enfermagem sob a ótica do sistema
político-econômico da sociedade capitalista e ressalta o surgimento da
Enfermagem como prática profissional institucionalizada. Esta análise inicia-se
com a Revolução Industrial no século CVI e culmina com o surgimento da
Enfermagem moderna na Inglaterra, no século XIX.
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